segunda-feira, janeiro 05, 2009

Marley e Capitu


As pessoas que amamos devem ser livres, e isso inclui nossos cães. Por isso eles devem poder fazer tudo o que querem. Devem ser eles mesmos, sem as manias opressivas de controle impostas pelo homem. As manias militares que vejo toda vez numa praça perto de casa. Ali “donos” e “donas” ditadores obrigam seus cães a pegar coisas, a andar em passadas ritmadas, a ficarem quietos e uma série de comandos. Muitos pensam ser superiores a seus cães, por isso se acham “donos”. Não sabem como seriam mais felizes se deixassem seus bichinhos serem eles mesmos e cometerem todas as suas loucuras que são apenas travessuras de almas selvagens-infantis. É isso o que sempre fez o insano labrador Marley, que jamais foi servo de seus “donos”, mas sim um companheiro fiel, mais que isso, um ser da família.
Por isso Marley ajudou seu parceiro humano, o jornalista John Grogan, a se tornar um colunista famoso. Porque Grogan criou uma coluna de crônicas sobre o cotidiano em que Marley quase sempre fazia uma participação especial. Porque Marley era um cão especial, único, e não esses bichinhos amestrados sem graça que se proliferam pelas praças e parques dos seres humanos “civilizados”. Por isso o livro Marley e Eu foi um sucesso mundial, assim como está sendo esse delicioso filme que faz rir e chorar nos cinemas. Porque Marley não tem freios morais e adestradores (bom, na verdade até tentaram levá-lo a uma aula.. em que ele foi expulso depois de enlouquecer a adestradora...). Porque Marley, “o pior cão do mundo”, alcunha com que Grogan o chama algumas vezes pelas diabruras, é na verdade apenas um cão que deseja viver e amar intensamente. Por que será que o cão mais estabanado do mundo de repente para quietinho na frente dos bebês do casal (sim, Grogan vai ter três com sua esposa) sem machucá-los. Por que o cão mais doido do planeta de repente dá um tempo de comer até o assoalho da casa e bota sua cabeça no colo da mulher que acaba de perder aquele que seria seu primeiro filho?

Marley é adorável porque contraria as ordens e paranóias humanas. Minha pequena dálmata gordinha insana Capitu se apaixonaria facilmente por ele.
A Capitu para quem um dia joguei uma bolinha e ela apenas acompanhou com os olhos e cabeça e depois olhou para mim como se eu fosse um idiota, como na verdade era pedir que ela pegasse a bolinha.
A Capitu para quem eu grito “desce!” e ela deita e fica me olhando com a maior cara de sonsa do mundo.
A Capitu para quem eu falo firme “fica aqui!” e ela sai correndo para procurar comida no pé da árvore e na moita onde sempre tem alguma coisa.
A Capitu para quem eu grito “larga isso!” e ela olha pra mim encapetada antes de devorar meio mamão inteiro que o velhinho da praça não desconfia que não são os passarinhos que comem o papaya mas sim uma dálmata legítima: esfomeada 24 horas por dia. Detalhe: o meio mamão é apenas parte da mamãozada que não deixo ela comer tudo.

A Capitu que pula no meio das minhas pernas enquanto eu tento fazer abdominais no banco da praça.
A Capitu que se enfia por baixo da minha cabeça e lambe minha testa enquanto tento fazer flexões.
A Capitu que na hora em que os outros dois dálmatas finalmente foram dormir e ficaram quietos resolve dar sua uivada tradicional feito um lobo das estepes toda santa noite.
A Capitu que, nos dias de calor, eu ordeno “fica deitada aí!” (fora da casa) e ela fica até eu sair do campo visual dela e desembestar pela casa feito um furacão, subir as escadas feito um bólido e descer, invariavelmente, com uma meia branca na boca.
A Capitu que só entende, por alguns segundos, uma coisa: uns tapas na bunda. Que logo ela esquece para aprontar mais uma de novo.
A Capitu que deve ser o único cachorro do mundo que de repente fica com saudades da sua casa, pega a guia com a boca e sai correndo da praça em direção à casa enquanto eu saio correndo atrás dela.
A Capitu que ama sua casa e seu dono com a liberdade e loucura que os cães adestrados perdem um pouco pela mania de controle de seus donos neuróticos.Viva Marley e Capitu!

3 comentários:

  1. Ai, Zé, as estripulias da Capitu me fizeram chorar... O meu Marley nasceu em 1998. Era madrugada, 14 de junho, e fazia muito frio. Ela estava agitada, andava de um lado para o outro. Parou e chamou bem alto, até que nos levantamos. O que vimos foi a mais bela e verdadeira demonstração de amor. Em pouco tempo, mãe e bebês se aqueciam na caminha de madeira.
    Eram quatro meninas. Um menino. Olhos imensamente azuis, bolinhas de pêlo. Entre as meninas, a loirinha era quem mais chamava a atenção: foi a primeira a andar, correr e uivar.
    Pouco mais de um mês e os filhotes seguiram seu caminho. A Milla chorou. Difícil se separar de sua cria assim, tão cedo. Como recompensa, ficamos com a Arieska, a husky loirinha.
    O único menino foi para a casa do meu irmão mais velho. Foi chamado de Dick.
    Semanas depois, o Dick teve de voltar. Era dengoso e manhoso. E chorava demais. Em seu rosto, uma máscara cor de champagne. Sorriso ingênuo. Olhos de quem deseja descobrir o mundo. Ele ganhou um novo lar e um novo nome: Zarkov, famoso jogador russo de xadrez.
    Os três, mãe e bebês, disputavam agora a atenção e o espaço da casa. O Zak (meu eterno Negão) era o mais arteiro e desobediente. Sempre desembestava, quase nos derrubando, quando se sentia pressionado pela coleira ou avistava um bichinho do outro lado da rua. A Lilica era a preferida de todos. A Milla sempre foi a chatinha, chantagista e chorona.
    Em 2004, numa sexta-feira, 13 de fevereiro, a Lilica comeu uma dose grande de veneno (o veterinário disse que dava pra matar um São Bernardo!). Lembro de cada segundo desesperador desse dia. A perda foi dura. A Milla e o Zak não entenderam, mas também sentiram a nossa dor. Demoraram a se “acostumar” sem ela.
    Aos poucos, o Zak voltou a brincar. Ele sempre gostou de bexigas coloridas. A gente voltava das festas com várias, ele olhava encantado. Só se assustava quando elas estouravam. Olhava com ar de interrogação. Ele já estava com mais de 7 anos, mas mantinha o jeito brincalhão de filhote.
    Todos os dias era só escutar o barulho do portão que vinha todo amoroso receber a gente. E chamava com seu vozeirão. Sentava, puxava a gente com a mãozinha, pedindo carinho. Ele gostava de abraços e afagos. Era um moleque abobalhado (no melhor sentido da palavra). Ele não sabia ser “grande”. Eterna criança. Lembro quando nasceram os filhotes dele com a Hanna, nossa vizinha. Ele sempre foi estabanado, mas, estranhamente, tomava cuidado com os bebês. Olhava encantado para eles, como se dissesse cheio de orgulho: “são meus, são meus!”.
    Quando o Zak morreu, em 2007, de câncer no fígado, um pedaço de mim foi junto. Até hoje é difícil encarar, me pego chorando muitas vezes...
    Desculpa a empolgação, Zé, mas é impossível não resgatar a história, lendo o seu texto. O filme do Marley é lindo. E a sua Capitu tem olhos meigos e doces. E, apesar de vc dizer que ela implica com husky, tenho certeza que ela se apaixonaria pelo Negão também, haha... Um beijo!

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  2. Thaína, a história de seus cachorros tb é linda! Gostaria de conhecê-los... Um abraço. V.H.

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  3. É.. Eu li Marley e eu logo após ter perdido a Valentina. Não sabia o que tava me esperando... Não preciso dizer o que houve quando o livro foi chegando ao final, rs.
    Hoje ainda ouço o barulinho das suas patinhas, tenho cuidado ao sair, pq ela gostava de fugir e sair correndo pelo prédio e nas escadarias... Ainda acordo para trocar o jornal dela, odiava rua, não tinha quem a fizesse dar uma volta no quarteirão. Ela gostava mesmo era da janela, parecia aquelas "Fifis fofoqueiras",rs. Era uma vira-lata, linda, meiga, companheira.
    Quando minha mãe faleceu, achei que ia perder tb a Vavá, ela segurava nas cobertas da minha mãe e chorava. Eu , com meu mundo caído, não sabia o que fazer para animá-la. Aos poucos ela foi se recuperando, e acabou sendo minha companheira.
    Ela ficou doente, teve um problema sério no fígado, ficou toda inchada e não caminhava mais.
    E com dor no meu coração, orei... pedi, pedi para que a levassem, não era justo ela sofrer como sofria. No dia seguinte , fui trabalhar, e fiquei sabendo que ela se fora.
    Ficou saudades, muitas, e um vazio enorme dentro do meu coração.
    Assim como a Thainá, muitas vezes choro, choro de saudades, querendo um minuto a mais ao lado da minha Valentina.
    Realmente, o cachorro é o melhor amigo do homem.
    Curta muito a tua Capitu!!!
    Um beijo,
    Lu

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