terça-feira, dezembro 27, 2011

A canção do vento


  Sábado ou domingo cedo. Enquanto subo a pé a avenida, armado com meu skate longboard, sinto mais uma vez a inesgotável fonte de sentimentos e significados que meu único mas poderoso brinquedo urbano me proporciona.
   Sinto a arma de brincar como meu violão ou guitarra, meu instrumento musical que carrego com as mãos até o pico, antes de descarregá-lo e tocá-lo com os pés. Mas não é qualquer violão, pois a eletricidade de uma queda de longboard é tão grande e intensa que me sinto como aquele mariacchi pistoleiro do filme de Robert Rodriguez, interpretado pelo Banderas.
    Sim, um mariacchi pistoleiro do bem, caminhando tranquilo, alma lavada, e pronto para mais um duelo ladeira abaixa. Só que esse duelo é na verdade parceria, pois o chão duro da descida é liso e, portanto, é onda perfeita. E voar ladeira abaixo é música e dança.
   Voo. Enquanto desço a suave e longa montanha de asfalto, ouço a canção do vento, componho minha própria música. Cada acorde, um movimento. Movimentos que são dança. Apeno desço e faço curvas abertas, amplas, o corpo brincando de estilo. Sim, às vezes é preciso virar mariacchi pistoleiro ao desafiar os carros que vem de trás. Em geral há respeito, mas sempre há uma besta de mal com a vida ou que ainda traz o velho e estúpido preconceito de que skate é coisa de vagabundo. Mais um infeliz vai ter que esperar, coloco a mão, “espera”, não mudo meu caminho, ele que espere alguns segundos (é pedir muito?) antes de eu terminar a descida e desaparecer entrando na avenida ao lado.
   Minha raiva contra a estupidez humana termina logo. Mais um idiota vai embora acelerando enquanto eu desço de meu violão mágico e caminho de novo, subindo a tranquila avenida paralela. Um último pensamento para o imbecil sobre rodas: Quem é mais rápido? Um motorista escondido dentro de uma máquina ou um homem voando em plena avenida que para a maioria é apenas uma via de passagem? Só sei que minha passagem é grátis. Não gasto gasolina. Não fico preso. E ainda bebo vento, adrenalina e liberdade.
    Subo tranquilo, há verde, passarinhos de todos os tipos e raros carros por onde subo. Há algumas pessoas que cumprimento, como o professor, o passeador de cães, os garis, o empregado de uma mansão que chega no casão e o cão explode de alegria ao vê-lo. Há os cães a quem dou bom dia. Tem um que tá sempre sentado com cara brava e triste, será que o dono passeia com ele? Há o cão malucão que faz a maior festa, esse eu sei que passeia, já o vi felizão andando com o dono.
   Sim, essa subida é longa e cansa, mas prefiro o esforço do que pedir carona na outra avenida que desço. Deve ser minha aversão à máquina e seus motoristas. Deve ser essa subidona a pé dura mas relaxante espiritualmente. Toda subida é uma ascensão. É preciso ter fé. Fé na brincadeira que devemos injetar em nossas vidas. Fé na liberdade de caminhar com os próprios pés.
   Fé na vida.
   Fé na canção do vento que anima os mariacchis do asfalto, os longboarders.

quinta-feira, dezembro 22, 2011

Barça, a deusa-bruxa fatal

Tenho o hábito de assistir partidas de futebol na TV com um jornal ou revista na mão. O hábito nasceu nas tardes de domingo, pela mediocridade das partidas do Campeonato Brasileiro. Pela pobreza de treinadores covardes que enchem seus times de volantes brucutus - matando a arte no espaço vital de um time, o meio de campo – e ainda instruem seus laterais e alas a chuveirar na área. O problema é que esses últimos simplesmente não sabem cruzar, como os volantes brucutus são incapazes de dar um passe preciso mais alongado.
O jornalzinho ou revista na mão nunca resiste aos cinco minutos do 1º tempo quando o jogo é do Barça. O fenômeno se repetiu no último domingo. Se podemos ler e ver um jogo do Brasileirão ao mesmo tempo - tamanha a ausência de belas jogadas e um estilo (falta de) truncado, feio – quando aquelas camisas azuis e grenás movem-se flutuando pelo gramado e pincelando jogadas como Michelangelos da bola, é impossível não largar tudo e ficar fascinado.
A hipnose é tão grande que até os jogadores santistas sucumbiram a ela. Tive a nítida impressão, mesmo de tão longe, que os camisas brancas estavam abobalhados como um adolescente que de repente vê a musa da sua vida desfilando a sua frente, sorrindo, belíssima e, “desgraça” ainda maior, nua. Desgraça porque um time de futebol não pode ser um adolescente, ainda mais na máxima decisão do planeta. Mas os santistas ficaram assim: tontos, babões, enfeitiçados pelas sereias catalãs.
Sereias, sim, porque o futebol do Barça é venenosamente feminino. Os toques e passes são tão sutis e perfeitos, e os jogadores movimentam-se com tanta fluidez e leveza que somos envolvidos pela mesma sensualidade hipnótica de um menino ou homem que perde a fala e fica paralisado diante de uma belíssima mulher com toneladas de sex appeal.
O maravilhamento é ainda mais forte porque esse time-deusa-sereia nos apaixona, nos faz querer que suas partidas-recitais nunca acabem.
Sim, os santistas, mesmo disputando o jogo de suas vidas, se apaixonaram loucamente como um adolescente pela musa da escola. Até o treinador Muricy, depois de dar alguns ataques iniciais de raiva, caiu no torpor do seduzido que sabe que não há mais o que fazer, a não ser adorar a deusa que brilha a sua frente.
Pena, para os santistas – e dádiva para os amantes do futebol como deveria sempre ser, arte - que a deusa catalã (com atributos também argentinos e brasileiros) é bipolar: é também bruxa. Uma bruxa impiedosa, carrasca, que entra em ação quando a deusa não está com a bola. O bote acontece quando o Barça não está com a bola, e seus jogadores pressionam o rival de forma insuportável até tomarem a pelota e iniciarem de novo um tão belo quanto sinistro espetáculo de jogadas sensuais que só param num beijo motal chamado gol.
Quanta crueldade, em plena competição futebolística, um time de futebol finge-se sereia e atropela sem dó o rival como a mulher fatal que é. Se nem o maligno Mourinho, seus jogadores galácticos e capangas conseguiram aprisionar a deusa maior do futebol mundial, não seria Muricy e sua equipe inexperiente que retiraria o poder mágico do Barcelona. Inexperiente, sim, porque o massacre de Yokohama provou o que poucos jornalistas brasileiros diziam: que o futebol não só santista, mas brasileiro, está em um nível bem mais baixo que o europeu, e infinitamnte mais baixo que o do Barcelona. O "sensacional e disputadíssimo campeonato brasileiro" é na verdade um torneio de baixo nível técnico nivelado por baixo, com um monte de equipes medrosas jogando no erro do adversário. E o que dizer da “empolgante” seleção brasileira do Mano, que conseguiu ser desclassificado da Copa América pelo Paraguai? E o time de guerreiros cavalos do Dunga?
A real é que o futebol brasileiro virou hoje uma maioria de grossos ignorantes que distribui pontapés e malvadezas a mando de treinadores medrosos. Por isso que um de nossos poucos tesouros, o garoto Neymar, não resistiu e com uma sinceridade possível só num menino inteligente, não cansou de demonstrar ao final da hipnose toda sua admiração pela deusa Barça. Depois de abordar o feiticeiro-chefe da musa, o treinador-mestre-mago Pep Guardiola, dizendo (segundo um jornal espanhol) que queria jogar no Barcelona, nosso menino de ouro ainda teve a coragem de não inventar desculpas esfarrapadas. “Hoje a gente aprendeu o que é jogar futebol”.
Pena que Neymar é apenas um jogador. Pena que não poderá mudar o medo de nosso técnicos e dirigentes que preocupam-se em montar equipes “competitivas”, desde as categorias de base, em vez de montar equipes que joguem futebol. Que joguem com a arte que um dia marcou o futebol brasileiro.
Por isso que, apesar dos nobres esforços do presidente do Santos, um raro dirigente que gosta de futebol e não só de vitórias, logo Neymar irá embora.
Sempre louvei a coragem de Luís Álvaro em manter Neymar no Brasil, mas depois do massacre no Japão, acho agora que é um desperdício permanecer no Brasil. Pra que continuar jogando nesse deserto de talentos? Pra que seguir driblando um monte de pernas de pau?
Enquanto os clubes brasileiros não voltarem a amar o futebol arte que um dia foi nosso DNA, não há mais sentido em ficar.
Vai embora, Neymar, vá brilhar onde merece. Vista, por favor, a camisa azul e grená. Junte-se à deusa-bruxa. Só ali poderá desenvolver todo o seu potencial.
O espetáculo, a magia, a paixão e emoção do Barça se tornarão ainda maior quando você se juntar ao melhor time de todos os tempos.

segunda-feira, dezembro 05, 2011

Sócrates - O gênio mais valente

Ele não foi apenas um dos maiores artistas da história do esporte. Foi também um líder, na bola e na vida e, coisa rara na pobreza intelectual dominante no futebol, foi um pensador articulado, original e combativo. Mais que isso, Sócrates era um raro homem fundamental. Vital para o povo brasileiro por ser um raro famoso preocupado com  a justiça, honestidade e um país melhor.
Vital por ser, de novo, um raro famoso a criticar os poderosos e corruptos que mandam nesse bilionário negócio chamado futebol profissional. Enquanto a maioria das nossas estrelas da bola preferem associar-se, por puro interesse pessoal, aos dirigentes e projetos mais duvidosos e obscuros - como sempre fez Pelé, e hoje faz Ronaldo ao unir-se ao antes desafeto Ricardo Teixeira e à Copa da vergonha, de 2014 - Sócrates sempre fez questão de fugir do mal. E revelar quem faz o mal.
O mal que Sócrates combateu desde jovem, quando, aos 20 e poucos anos, combateu a concentração e as ordens ditatoriais dos chefes do futebol em plena ditadura no Brasil. Foi ele o grande articulador e líder da Democracia Corinthiana, movimento que comandou no clube, liberando os jogadores de obrigações escravocratas como ficar trancado numa concentração às vésperas dos jogos. Será uma coincidência que aquele Corinthians livre, de Sócrates, Zenon, Biro-Biro, Casagrande e cia. foi a equipe que jogou o mais belo futebol da história alvinegra? Não será a liberdade lutada por Sócrates uma das razões daquele futebol de toques refinados, tabelinhas e lindos gols?
E a luta dele não ficou nos gramados. Sócrates participou ativamente pela campanha das Diretas Já, e pediu em históricos comícios a volta da eleição direta para presidente nas ruas de São Paulo. Imaginem o que era num meio tão alienado quanto o dos jogadores de futebol um craque mostrar suas convicções políticas e brigar por elas.
A mesma liberdade Sócrates liderou com a, para muitos, mais bela seleção brasileira da história, o Brasil da Copa de 82. O Brasil do treinador-mestre Telê Santana. O Telê que escolheu um grupo de artistas excepcionais para praticar o mais belo estilo de jogo que vi na história. Um jogo muito mais bonito que até o do maravilhoso Barcelona de hoje, porque o Brasil de Sócrates, Cerezzo, Falcão, Zico, Leandro, Júnior, Éder e Telê, diferente do Barça, atacava de todos os lados do campo. Porque o Brasil de Telê tinha quase 11 craques.

Mas voltemos ao Doutor. A injustiça histórica não deixou que ele fosse campeão do mundo em 82, nem em 86 (quando foi o melhor de nossos já veteranos mitos de 82). Depois, o corpo maltratado pelo cigarro e talvez já pelo álcool, foi afetando sua genialidade nos gramados, até encerrar a carreira sem o brilho do passado.
O gênio teve que sair de campo, mas o Brasil ganhou uma voz crítica fora dos gramados.
Pena que o Doutor não foi muito ouvido. Como nunca fez pacto com os poderosos - do futebol, das empresas ligadas a esse mundo, ou da mídia brasileira - a voz fundamental e as ideias de Sócrates não se espalharam pelo país. Enquanto muitas estrelas da bola e seus discursos vazios tomaram a grande mídia brasileira - craques dando declarações exclusivas banais ao maior conglomerado de comunicação do país, Sócrates ficou sempre meio escondido, combatendo moinhos no canal aberto menos visto do país, a TV Cultura, ou na revista Carta Capital, nossa menos vendida (nos dois sentidos...) publicação semanal.
Foi na Carta Capital que o Doutor escreveu um de seus últimos textos incisivos. Começou sua crônica falando de homens que sonharam e lutaram por um mundo melhor (e eu lia pensando, onde ele quer chegar com isso?), de repente Sócrates, em sua rica e poderosa argumentação, começa a detonar o capo maior do futebol mundial, Joseph Blatter, e seu comentário mentiroso de que “não há racismo no futebol”. Só depois entendi onde o Doutor queria chegar e reproduzo o trecho esclarecedor de quem nunca temeu nada, por falar à service da verdade:

Certamente os negros de todo o planeta se sentiram agredidos, menos um: Pelé. Que de preto parece ter somente a cor da pele. Ele não só corroborou com a tese de Blatter como acrescentou outras bobagens nascidas de seu pseudointelecto. De uma coisa sabemos de há muito: Pelé jamais sonhou com o que quer que seja.”

Pelé jamais sonhou, muito menos agiu por um mundo melhor, quis dizer o Doutor. Pobre Brasil, então, que perde Sócrates e vê hoje, além do “atleta do século”, um outro ex-ídolo tão importante dentro de campo, e tão amado em sua carreira, Ronaldo, virar parceiro de Ricardo Teixeira no Comitê Organizador da Copa de 2014. O que Sócrates terá pensado do jeito debochado com que Ronaldo deu sua entrevista coletiva ao ser empossado no cargo? O que o valente Doutor terá pensado da declaração de Ronadlo, de que a Copa não tem nada a ver com nossa necessidade de mais hospitais e saúde para o povo? O que o velho Magrão terá pensado de Ronaldo, um empresário do esporte, dizer que não existe nenhum conflito em ter negócios nesse setor com seu trabalho pela Copa de 2014?
Mais que um gênio - para quem não o viu jogar, um artista tão criativo quanto Zidane, tão frio na cara do gol quanto um Romário, tão cerebral quanto um Xavi e Iniesta juntos, tão líder como um Lugano (e um líder e capitão muito mais exemplar e inspirador que um certo Dunga...), tão elegante e cerebral quanto Ganso - Sócrates era um daqueles raros homens essenciais.
Por isso sua despedida deixa um vazio tão grande quanto o deixado por Ayrton Senna, outro Brasileiro maiúsculo que nos deixa saudades até hoje.
Mas como Senna, uma feliz coincidência (ou talvez uma simples questão de bom caráter e criação familiar, além de ótima formação educacional) faz as ideias e lutas de Sócrates permanecerem vivas de outra forma. Se Ayrton teve na irmã Viviane a executora de seus sonhos de um país melhor, com a criação do Instituto Ayrton Senna, Sócrates tem no nobre trabalho de seu irmão, Raí, a disseminação de parte de seus sonhos.
Raí, junto de outro homem exemplar, Leonardo, toca a Fundação Gol de Letra, e ajuda a dar uma chance de vida para muitas crianças carentes.
Oposto do irmão como atleta, pois se cuidava e tinha um físico excepcional, Raí continua, porém, a luta do Doutor de uma outra forma.
Mas continua.
Pena, no entanto, que as pedradas de Sócrates, perderam para sua dependência do álcool, que fragilizou demais seu organismo.
Pena que não o ouviremos mais, nós, os que não somos reféns da grande mídia e de sua reverência a falsos ídolos com quem tem negócios.
Pena que não teremos mais o Doutor para detonar e cobrar muitos pilantras que mandam no futebol brasileiro e mundial.
Pena que Sócrates, que defendeu o Corinthians com tanta arte, coragem e beleza , era persona non grata na atual administração do clube, porque ele era contra o Itaquerão:

“Não precisa construir outro estádio em São Paulo. Os Estados Unidos não fizeram nenhum. A Alemanha fez um. Será um carnaval de um mês com uma bela conta para pagar depois. Que o Corinthians precisa de um estádio, é óbvio. Mas não precisa ser agora, nem com a gente pagando. Para que? Vai levar o que, além do estádio? É uma área para onde nunca se deu valor. Não tem hospital público de boa qualidade, educação de boa qualidade. Estádio de futebol não leva isso. Vai ter especulação imobiliária. Aí, o corinthianos que mora lá vai ser expulso. Isso não é avanço”, declarou Sócrates em uma de suas últimas entrevistas, na revista da ESPN ainda nas bancas.
Pena que um Homem fora de série como esse nos deixou. No meio dessa série de homens, famosos e ídolos tão pequenos, Doutor Sócrates é uma perda irreparável.
Mas a luta continua nas vozes de jornalistas corajosos como um Juca Kfouri (grande amigo de Sócrates), um Mauro Cezar Pereira, um Lúcio de Castro, e algumas poucas estrelas do esporte que arregaçam as mangas por um Brasil mais igual e decente. Em especial, destaco aquela que sempre teve a mesma coragem do Doutor, Magic Paula.
Que as ideias de Sócrates sejam conhecidas pelas novas gerações de profissionais do esporte que trabalharão na Copa e na Olimpíada. Que eles e elas tenham coragem de trazer algo de bom para o país e povo, e não só as dívidas astronômicas que virão. Isso, claro, se conseguirem espaço entre os muitos chefes de quadrilhas que dominam o esporte nacional... Uma das raras exceções parece ser o presidente do Santos, Luís Álvaro, um cara que faz tudo para preservar suas estrelas e com isso deixa tesouros no país em vez de só pensar em faturar mais.
Do resto, poucos se salvam.
Que saudade, Doutor!

terça-feira, novembro 01, 2011

Palhaços escondem lágrimas e ensinam a viver


   Pangaré é um jovem palhaço em crise de vocação. Sujeitão tranquilo, pacato e simples demais, pensa que talvez poderia ter outra vida, longe da rotina dura do pequeno circo que comanda interiorzão de Minas Gerais afora. E ele ainda precisa encontrar ânimo e forças para fazer os outros rirem.
O Palhaço, obra tão delicada quanto profunda do diretor e ator principal do filme, Selton Melo, é uma lição de resistência e amor do velho circo. Do circo que praticamente não existe mais neste terceiro milênio em que o respeitável público foi substituído pelo público tecnológico-consumidor, refém das grandes produções cheias de pirotecnias e aparatos modernos como um Cirque du Soleil ou um megashow do U2.
Assistir a esse filme é um reencontro e resgate de uma infância e mundo antigo, que existiram até a última década não escrava dos aparelhinhos eletrônicos, computadores e megaproduções. Ver a trupe de Pangaré rodando estrada, montando a lona e apresentando suas poucas mas intensas personagens, entre palhaços, seres um pouco bizarros e uma belíssima e sedutora bailarina que cospe fogo é deixar entrar a beleza da simplicidade e da ingenuidade perdidas hoje. Numa realidade de hoje em que tantos humoristas – esses falsos palhaços - invadem as TVs e internet com suas piadas debochadas, sujas, agressivas e até mórbidas, os velhos seres de perucas, roupas coloridas e nariz vermelho deste filme são um sopro de pureza e uma viagem no tempo.
Uma viagem profunda pelo coração de Pangaré e todos aqueles que escondem a dor e a tristeza atrás das brincadeiras, essas máscaras contra o rodo e front cotidiano que precisamos encarar.
Sem o riso a vida seria um desperdício, já ensinava o palhaço maior da história, Charles Chaplin e seu inesquecível vagabundo Carlitos. Mas Chaplin mascarava sua dor profunda pessoal com seu mago de chapeuzinho, roupas largas e bengala.
Pangaré não é tão triste como o mito maior, mas deixará a magia e o sacrifício do circo para sondar outras oportunidades da vida. Fora das lonas, das cores e dos artistas que driblam as poucas condições e grana para oferecer um pouquinho de alegria e arte às pessoas humildes, ele perceberá como o circo é um refúgio.
Um belo e amoroso refúgio cheio de amigos guerreiros e sábios simples, e onde está o mestre maior, seu velho pai, também palhaço, um gigantesco Paulo José num daqueles papéis da vida. Herói da arte e da vida, incrível como Paulo consegue domar sua própria doença real, o Mal de Parkinson, para dar a delicada, ampla e justa medida do velho palhaço que nunca titubeou em sua vocação: fazer as crianças e pessoas puras rirem. Esta talvez a lição maior deste filme: a coragem de quem não foge da missão que aprendeu com a única verdade que deveríamos seguir, aquela que arde em nosso coração.
A coragem dos palhaços. O mundo seria muito melhor com a valentia de Pangaré e seu pai, tão distante da covardia dos que apelam, por fama e dinheiro, para fazer os outros rirem apelando aos piores e mais invasivos sentimentos (des)humanos. 
Que saudade já do Pangaré, seus companheiros e do sensacional delegado feito por Moacir Franco, do qual não revelarei detalhes para não estragar a surpresa.
Que saudade dos palhaços de verdade como Pangaré e sua trupe, que não precisavam ridicularizar e invadir os outros para semearem o riso e a alegria.

quinta-feira, outubro 27, 2011

Maurren Maggi - A mais bela campeã

Poucas atletas na história do esporte brasileiro foram e são tão belas quanto Maurren Maggi.
Bela por esse fantástico e escancarado sorriso de quem realmente ama o que faz e a bandeira que carrega com tanta verdade e paixão. Bandeira e país que ficam ainda mais bonitos grudados às suas formas esculturais - longilíneas e esguias como uma onça pintada. Pintada de ouro, três vezes na história dos Jogos Panamericanos.
Bela por essa fera ser também dona de uma voz delicada e emocionada a cada conquista.
Bela por sempre lembrar da pequena Sofia, sua filha, a cada triunfo.
Bela porque essa super mulher ainda vibra com a graça de menina que nunca deixou de ser. A menina Maurren que nunca esquece de seu talismã de pelúcia, o simpático cachorrinho Leão.
Bela porque Maurren é, talvez mais que tudo, o exemplo da guerreira que venceu o doping injusto (*), uma precoce despedida - desencantada - do atletismo e um casamento desfeito para voltar aos saltos e lugares mais altos do pódio.
Bela porque numa das mais simples e bonitas provas do atletismo - o salto em distância - a prova fica ainda mais plástica e sedutora quando é ela, Maurren, quem salta.
Bela porque ali, naquela pequena pista de corrida e tanque de areia, Maurren Maggi faz da brincadeira tão antiga e gostosa de correr e saltar uma aula de velocidade, força, explosão e arte.
Uma aula que ela continua dando aos 35 anos, extendendo sua vida de atleta e paixão de menina.

Campeã olímpica e agora tricampeã panamericana (saltando ontem 6m94 no Pan de Guadalajara), poucas atletas brasileiras voaram tão longe, e com tanta beleza, dentro e fora de seu esporte como essa eterna namoradinha do Brasil. Namoradinha no diminutivo apenas para corresponder ao carinho que ela sempre nos inspirou. Ela, a que nós, os legítimos amantes dos esportes e do Brasil, sempre amamos como uma das mulheres-exemplos de nossas vidas.
Que sua voz doce vitoriosa ainda siga ouvida nas grandes competições, explodindo de alegria, até pelo menos Londres 2012, querida Maurren.
Querida campeã do coração e fibra ainda mais belos que sua fantástica coleção de medalhas de ouro.

(*) Maurren doi suspensa do atletismo em 2003 por um suposto doping. Ela descobriu pouco depois que a substância proibida vinha de uma pomada que passava contra celulite. Pomada receitada, irresponsavelmente, por sua dermatologista, uma badaladíssima médica paulistana. Testes com a pomada, feitos pelo jornalista Moacir Ciro Martins, no antigo Diário Popular, mostraram que a pomada continha mesmo, em altas doses, a substância dopante. Quanto à falta de cuidado da médica, atestei o mesmo em minha própria pele quando adolescente, quando ela me deu o mais poderoso e ofensivo remédio contra espinhas sem ter o cuidado de me pedir exames gerais. O remédio chamava-se Roaccutane, até hoje uma droga muito perigosa para o nosso organismo.

Gente que quer mudar o mundo

De Tahrir a Zuccotti, o poder do lugar
por Michael Kimmelman (New York Times)
O movimento "Ocupe Wall Street", que surgiu no mês passado em Manhattan e chegou a mais de 900 cidades do mundo no fim de semana retrasado, prova entre outras coisas que, por mais importantes que sejam as novas mídias na difusão dos protestos hoje em dia, nada substitui o fato de as pessoas saírem às ruas.
Tendemos a subestimar o poder político dos lugares físicos. Aí aparece a praça Tahrir. E agora o Zuccotti Park, que até 17 de setembro era uma praça totalmente obscura no centro da cidade, a dois quarteirões de Wall Street. Algumas centenas de pessoas com ponchos e sacos de dormir o colocaram no mapa.
A Universidade Estadual de Kent, a praça Tiananmen, o Muro de Berlim: claramente usamos os lugares e a arquitetura para abrigar nossas lembranças e nossa energia política. A política perturba nossas consciências. Mas os lugares assombram nossa imaginação.
Por isso, entramos no Facebook e no Twitter, mas fazemos peregrinações a Antietam, a Auschwitz e à Acrópole, para fitar entulhos da época de Péricles.
Morando há alguns anos na Europa, costumo topar com parques e praças - seja em Barcelona ou Madri, em Atenas ou Milão, em Paris ou Roma - tomados por barracas de manifestantes acampados. Protestos e aglomerações são parte do pacto social europeu.
Talvez a diferença na América tenha algo a ver com a tradicional obsessão dos americanos por automóveis e autonomia, com a sua predileção pelo isolacionismo, ou pela preferência por apenas assistir ao invés de participar.
Na Europa, os protestos eram relativos a empregos, aos cortes nos gastos públicos e à dívida. No caso do Zuccotti Park, a mensagem está no acampamento propriamente dito.
Em sua "Política", Aristóteles argumentou que o tamanho ideal da pólis é dado pelo alcance do grito de um arauto.
Ele acreditava que a voz humana estava ligada à ordem cívica. Uma cidadania saudável exigia uma conversa cara a cara.
Quando a polícia proibiu os megafones no Zuccotti Park, ela obrigou os manifestantes a buscarem uma alternativa. O "teste de microfone" se tornou o método consensual, no qual a multidão repete, frase por frase, o que o orador disse, exigindo na prática que todos falem em uníssono. É algo lento e trabalhoso.
"Mas assim é a democracia"
, disse Jay Gaussoin, 46, marceneiro e ator desempregado. "Andamos tão distraídos hoje em dia que as pessoas se esqueceram de como ter foco. Mas o 'teste de microfone' exige não só que escutemos as opiniões dos outros, mas também que ouçamos realmente o que eles estão dizendo, porque temos de repetir suas palavras exatamente."
"Isso exige uma arquitetura de consciência"
, foi o adequado termo que Gaussoin usou.
O Zuccotti Park na verdade se tornou uma pólis (cidade) em miniatura. O fato de ele por acaso também ser um parque particular é um dos subtextos mais reveladores dessa história. Uma exceção aberta há alguns anos na lei de zoneamento exige que o parque, ao contrário dos espaços municipais, permaneça aberto dia e noite.
Isso jogou um inesperado holofote sobre a falência de grande parte dos espaços que são tidos como públicos nos EUA. A maioria deles são gestos simbólicos de incorporadores imobiliários em troca da construção de prédios maiores e mais altos. O Zuccotti está sujeito às regras do proprietário, que proíbem lonas, sacos de dormir e a guarda de objetos pessoais no local.
Toda essa situação ilustra até que ponto permitimos que o antigo ideal de espaço público virasse uma concessão comercial.
"Viemos aqui para ter a sensação de ser parte de uma comunidade", disse Brian Pickett, 33, professor de teatro e oratória na City University, de Nova York. "É importante ver isto no contexto da alienação de hoje. Ficamos sozinhos no Facebook. Mas as pessoas não estão sozinhas aqui."
E, dessa forma, os manifestantes também se revelam uns aos outros. Os egípcios descreveram esse fenômeno na praça Tahrir. Os manifestantes não só exibem ao mundo uma massa de pessoas. Eles descobrem pessoas com preocupações semelhantes ou mesmo idênticas. O parque é literalmente um terreno comum. O processo de gestão escolhido já é por si só uma mensagem fundamental de protesto.
Ele oferece os contornos de uma cidade, como eu já disse. Os manifestantes montaram uma cozinha para servir alimentos, uma secretaria jurídica, um departamento de saneamento, uma biblioteca com livros doados, uma área para as assembleias gerais, um posto médico, um centro de mídia onde é possível recarregar laptops usando geradores portáteis, e até uma loja abastecida com doações de roupas, lençóis, creme dental e desodorante -tudo de graça, assim como os mais diversos tipos de alimentos.
A produtora rural orgânica Sophie Theriault, 21, atua como voluntária no parque. "Nós nos reunimos todas as noites para falar sobre como manter este lugar limpo e sóbrio, mantê-lo como um lugar emocional e fisicamente seguro para todos", disse. "O consenso constrói a comunidade."
O compositor e engenheiro de som Patrick Metzger, 23, ecoou esse pensamento: "Pelas mensagens na internet, você nunca obtém informações sobre raça, classe, idade - quem as pessoas realmente são. A Fox News fala de turbas e gente esquisita.
Mas dá para ver como a mistura é realmente complicada: estudantes e pessoas mais velhas, pais com famílias, operários da construção na hora do almoço, executivos desempregados de Wall Street".
Metzger tem razão. A diversidade dos manifestantes, pelo menos durante o dia, é intrínseca à perseverança do protesto. Desde o 11 de Setembro não havia tanta gente perguntando "Você esteve lá?" e "Você viu?" a respeito de algum lugar em Manhattan.
É claro que a ocupação do mundo virtual juntamente com o Zuccotti Park está impulsionando o "Ocupe Wall Street", e uma coisa não seria tão eficaz sem a outra.
Só que é no terreno que os manifestantes estão construindo uma arquitetura da consciência.

segunda-feira, outubro 10, 2011

layla - eric clapton


Os primeiros acordes da guitarra são nervosos, urgentes, logo ficam mais agudos e acelerados, viram grito, uma declaração desesperada. O guitarrista começa a cantar então, dá seu recado, e logo chama, clama por ela, Layyyyyla!, diz que está aos pés dela, “Layla, you´ve got me on my knees”, as palavras são de um homem atormentado que, enlouquecido, se apaixonou pela mulher de um grande amigo
Poucas canções foram tão corajosas na história do rock, um homem arriscando tudo por amor e ainda com a coragem de gravar isso e, mais ainda, cantar para o mundo seu amor como uma serenata cósmica para todo o universo escutar, sim, todo o universo, pois que planetas não escutam a paixão estratosférica daquele que já foi chamado de deus da guitarra?
Voltemos à canção, e em sua belíssima parte final o grito dá lugar ao sussurro na poesia de um piano que é olho nos olhos, súplica doce pedindo, sem falar, por ela; e quando o piano cresce em intensidade, o deus solitário segue rasgando sua guitarra e dissecando seu coração sem medo. Podemos sentir Clapton tentando mostrar tudo o que poderiam ter juntos. Poucos acordes, riffs e solos foram criados com esta paixão genuína das cordas e teclas que buscam o amor proibido.
Deu certo. Layla, na verdade Patty Boyd, deixou George Harrison para ficar com Clapton.
Se o amor não durou – eram os anos mais loucos dele, no auge da dependência do álcool e drogas, e Patty-Layla não suportou - a canção é eterna.
O grito, Layyyyyla!, segue inspirando os apaixonados que não temem nada na hora de lutar pelo amor de suas vidas.

sexta-feira, outubro 07, 2011

Porque Romário é mais ídolo, do povo, que Ronaldo

Os dois foram monstros do futebol, campeões do mundo e protagonistas de carreiras fantásticas. O sucesso deixou-os milionários, sobretudo Ronaldo, muito mais marketeiro e envolvido com seus patrocinadores que o Baixinho. Não é por acaso, então, que Ronaldo montou uma agência publicitária, de marketing, gerenciamento de carreiras e tudo o mais que dê dinheiro com o futebol. Virou empresário de sucesso e um verdadeiro tubarão caçador dos atletas mais renomados.
Romário optou por outro caminho. Homem mudado desde que teve uma filha com síndrome de down, decidiu fazer alguma coisa pelos portadores da doença e por mais pessoas. Entrou na política e foi visto, antes de assumir seu cargo de deputado federal, como mais uma celebridade aproveitadora querendo mamar nas tetas de uma das maiores vacas do mundo: a mimosa e malandra Brasília.
A desconfiança e as chacotas com o Baixinho cessaram logo que começou a trabalhar e falar. E como tem trabalhado e falado, mostrando a mesma postura letal e sem medo que tinha na grande área. Tudo que é nefasto em nosso futebol, e não só no mundo da bola, é alvo do Grande Baixo: Ricardo Teixeira, CBF, Copa 2014, reforma do Maracanã etc etc. Ele ainda é contra o voto secreto, pois acha que seus eleitores devem saber no que está votando. “Quem votou em mim quer saber no que eu estou votando, se eu sou a favor do certo ou do errado”
disse ele, em imperdível entrevista na revista da ESPN Brasil. Romário ainda diz duas frases poderosas. Ambas revelam a consciência de seu papel e missão, fato raro num homem que veio do mundinho alienado ou egoísta do futebol brasileiro:
A primeira: “Hoje eu sou, sem dúvida, muito mais ídolo que antes.”
A segunda: “Vocês nunca vão me ver envolvido em falcatrua, em corrupção. Nunca.” Sobre essa declaração, André Kfouri, filho de Juca, escreveu em sua coluna no jornal Lance: “É a obrigação de qualquer cidadão, por isso não deveria chamar a atenção. mas ao sair da boca de um político brasileiro, e de forma pública, é dessas coisas que a gente tem de ler de novo para ter certeza do que está escrita. A confirmação distingue, gera respeito. O deputado Romário está fazendo tudo certo. Em sua atuação como fiscal da Copa do Mundo de 2014, tem representado a parcela da população que não age como primatas de auditório.”
De outro lado, temos Ronaldo. Aquele que ao encerrar a carreira chorou e nos comoveu. Lembro de que dei aulas sobre o valor dele em minha matéria de Atualidades, na escola. Mas cobrei o ídolo em uma afirmação para a molecada: “O mais importante agora é ele cumprir a promessa que fez: a criação de seu instituto social que ele batiza de Criando Fenômenos.”
Sim, ao meu ver, quem tem muito dinheiro e, ainda o benefício de ser uma estrela, deve fazer algo pelos que não têm num país ainda tão carente como o Brasil. O caso é que Ronaldo prometeu e até, agora, nada.
É essa inércia que foi citada por outro colunista do Lance, Alexandre Lozetti no brilhante texto “O poder que Ronaldo tem. Mas não usa...”. Alexandre mostra que “Ronaldo prefere posar de garoto-propaganda do Itaquerão, faz graça com o uso do dinheiro público e vive de afagos com figuras como Andrés Sanchez e Ricardo Teixeira. O ex-corinthiano  já esteve ligado a atividades na ONU. Já atuou na Unicef. Seu trânsito é muito maior pelo mundo (que o de Romário). Seu pedo (no bom sentido), idem. Inteligência não lhe falta. Não falta nada a Ronaldo para ser um defensor do povo brasileiro também fora de campo. Ou melhor, parece faltar o essencial: vontade.
Ronaldo deveria proteger o torcedor, a quem agradeceu, emocionado, em sua despedida. Até 2014, há tempo para decidir se quer assumir sua relevância ou seguir pensando em benefício próprio e de tão poucos.”
Prefiro o conceito de parceria de Romário, parceiro do povo, da decência, da verdade e de um país melhor.
Prefiro a consciência do Baixinho, apresentada em outra resposta à ESPN, ao atacar a reforma do Maracanã: “Não dá para admitir que se gaste R$ 1 bilhão em um estádio e que num raio de 10 km tenha pelo menos três hospitais municipais em estado deplorável, que se recebessem 1% d valor da reforma poderiam ser inteiramente renovados, em aparelhagem, capacidade de profissionais, qualidade dos leitos e tantas outras coisas.”
PS – Quem quer se informar sobre a verdade do esporte no Brasil, a fonte mais confiável estão nas páginas do Lance e nas várias mídias da ESPN, seja em papel, TV ou rádio (nesta, em parceria com o Estado de S. Paulo).

segunda-feira, setembro 26, 2011

Anjo

    Babalu e Sansão, inseparáveis 
Já nasceu enorme e ainda agarrou as tetas de sua mãe, a louca e elétrica Babalu, com uma fome de Obelix querendo beber no caldeirão mágico. Nenhum outro cachorro que tivemos ganhou um nome tão rápido e óbvio: Sansão. E ele honrou o nome, cresceu e se tornou o maior cachorro que já tivemos.
Seu tamanho, porém, contrastou com o temperamento mais calmo e dócil de todos que fizeram a nossa história. Sinônimo transparente do que é ser bonzinho.
Atropelado quando ainda filhote, não permitiram que ele partisse tão cedo.
Ganhou uma segunda chance.
Ou foi embora e alguém lá de cima, comovido com tamanha injustiça, o mandou de volta.
Sim, talvez não fosse um cachorro e sim um anjo.
O anjo atrás da porta da cozinha. Porta que, se aberta, libertava dos mais duros problemas do dia-a-dia e da vida sua família sofrida.
Bastava abrir a porta e lá estava ele e sua imensa cabeça e olhar meigo esperando um carinho.
Nunca vi um cachorro gostar tanto de carinho como ele. Tampouco ficar paradinho, recebendo com tranquilidade angelical os afagos enquanto dava seu obrigado em forma de gemidos de alegria.
O anjo também meio malucão quando invadia a casa, fazendo a alegria também dos visitantes, como fez na Copa de 2002 em que nos ajudou com sua correria alegre a trazer o hexa. Todo jogo do Brasil de Felipão, Rivaldo, Ronaldo e Marcão, quando a coisa apertava tinha alguém pedindo, “solta o Sansão!”
O anjo que foi, por 10 anos e meio, o equilíbrio daquela casa, pois era impossível não melhorar o astral só de vê-lo, nosso imenso bicho de pelúcia vivo.
Nosso amigo.
Nosso melhor amigo e sua imensa cabeça a procurar as nossas mãos, como se fossem mãos nos fazendo carinho.
Mãos que eram também suas patas, que nos dava enquanto ficava sentadinho, elegante, bondoso.
Amoroso no sentido máximo, de amor mesmo que nos dava sempre.
Era tão bonito e forte que não percebemos que envelhecia, nessa que é a grande injustiça cometida pelo Criador com os cachorros. Envelhecem e parecem os mesmos. Por isso jamais nos preparamos para sua velhice.
Por isso não percebíamos que sua dificuldade, nos últimos tempos, para se sentar e depois levantar, podia ser algo grave.
Cachorros não deveriam viver tão pouco, em geral uma década.
Deveriam ser eternos.
São.
No coração de quem os amou, Sansão será sempre o ombro amigo e paz necessária que devíamos ter sempre. Como seria bom bastasse olhar pra cima e recebêssemos de novo sua benção, seu conforto, sua serenidade de bebê crescido puro, inocente, pacífico que nunca fez mal a ninguém.
Que nunca brigou com ninguém.
Que nunca desrespeitou a mãe, que ficou junto dele a maior parte de sua vida, mais de 8 anos.
Incrível como, quando abríamos a porta, era sempre ela primeiro a aparecer, a querer entrar, enquanto ele ficava paradão, na boa, respeitoso, só olhando, sabendo que mãe é mãe, que ela vem sempre em primeiro lugar.
Incrível como nunca avançou em uma migalha de comida dela.
Incrível como nunca, mas nunca mesmo, brigou com sua mãe.
Incrível como cuidou dela até o fim, e mesmo quando sua mãe estava indo embora, cada vez mais magra, tinha muito cuidado para não machucá-la com sua força.
Incrível como a limpava lambendo mesmo ela já velhinha e frágil. Ela, a mãe que ele amou como todo filho grato ama sua mãe, com todo o carinho e amor do mundo.
Esta é uma das poucas coisas que atenua um pouco a nossa dor: poucos cachorros tiveram uma vida tão bonita como ele, vivendo protegido e amado pela mãe (ela também nunca levantou a voz ou o latido pra ele) por tantos anos, e sabendo retribuir com tanta beleza todo o calor que Babalu lhe deu.
Mas um dia tudo acabou. Um dia o rei de nosso cães não se levantou mais. Foi internado dias e depois operado, mas poucos dias depois não resistiu.
É duro demais resistir sem ele.
Acho que só resistimos porque ainda existe sua irmã, que não se dava bem com a mãe, e por isso viveu a vida toda longe do irmão. Mas Capitu, mesmo danada e meio maluca como a mãe, também é carinhosa, também geme falando como o irmão. Também tem o coração bonito dessa família e geração maravilhosa de dálmatas que começou com a avó, a inesquecível Duda, que até estrelou meu primeiro livro (Mundaka).
Também tem o amor, que não conseguimos medir, dessa geração de dálmatas que esteve junto de nós por mais de duas décadas.
Uma geração de dálmatas que só existiu porque um dia eu amei demais uma menina e nós dois, cada um com seu dálmata, criamos tudo isso, mas essa é outra história...
Capitu é a última.
Que resista mais, por favor. Porque anjos são maravilhosos mas não conseguem nos dar seu calor.
Mas pelo menos nos deram sua história e suas lições de afeto.
Com Sansão, além de todo o amor e fidelidade, aprendi que é preciso ter calma e ser bom, sempre.
Paz e bondade. O que mais um ser humano, num mundo como esse, precisa aprender?
Obrigado, meu amigo, você foi tão belo e digno que será eterno e um dia passarei para a filha que eu tiver tudo o que me ensinou.
                     Duda (deitada), Babalu e minha mãe

segunda-feira, setembro 12, 2011

O sonho máximo (O Homem do Futuro)


“Todos os dias, quando acordo,
não tenho mais o tempo que passou
Mas tenho muito tempo
Temos todo o tempo do mundo”

O mais duro é que não temos. O homem conseguiu curar o incurável, afastar doenças e até a morte, estender sua jornada, mas há uma barreira que ainda não venceu.
A barreira que é talvez o maior de todos os sonhos.
O tempo.
Viajar no tempo.
Voltar atrás.
Voltar para quê?
Para consertar. Os nossos erros. Sobretudo, os erros que cometemos com o mais belo e terrível dos sentimentos-poderes, o amor.

O amor que Zero, personagem de Wagner Moura, busca, desesperadamente, resgatar.
Reencontrar num passado distante.
No passado mais belo de quando ainda acreditamos e podemos tudo.
O passado do amor da juventude.

Neste passado está Helena, nome de deusa para uma Aline Moraes arrebatadora a cada cena em que aparece. Tão sexy quanto doce. Tão divina quanto humana. Porque ama de verdade, porque ama com pureza, Helena merece qualquer coisa para não perdê-la, ou reconquistá-la.
Até uma viagem no tempo.
Um tempo que ela canta com paixão, visceral, no grande hino da juventude brasileira não só dos anos 80, mas até hoje, Tempo Perdido, de Renato e sua Legião Urbana.
De seus lábios emanam toda a sensualidade, tesão e urgência da juventude. Do amor que ainda sabe ser paixão da juventude.

Você lembra dos momentos mais apaixonantes da sua vida?
Você lembra das canções que embalaram esses momentos?
Você lembra e essa cena ainda o assalta, ainda o invade, tantos anos depois?
Você já tentou o impossível de voltar atrás e viver aquilo de novo?
Se você sente tudo isso, O Homem do Futuro não será um simples filme.
Não será apenas esse espetáculo irresistível que nos faz rir lá do fundo de forma tão gostosa, e tantas vezes, com as loucuras que Zero diz e faz para viajar no tempo e tentar reescrever a sua história.
Não será “apenas” essa magistral aula de atuação de um Wagner Moura espetacular, que nos faz de morrer de rir em um momento e no minuto seguinte nos emociona com seu amor e sonho tão palpável, tão verdadeiro. Tampouco veremos apenas uma Aline Moraes sublime, conseguindo a perfeição de expressar o maior dos sentimentos a cada palavra, a cada gesto, a cada olhar vulcânico.
Mais que um filme arrebatador, comédia romântica impecável, o Homem do Futuro é também um drama-hino ao primeiro amor, talvez o mais verdadeiro para muitos, porque puro.
E esse hino ainda vem não só embalado, mas completado com cada verso tão belo quanto furioso da canção que atravessa e sustenta todo o filme.
Uma canção que é tanto a verdade quanto a desgraça dos amores e realidades juvenis:
“Todos os dias, antes de dormir,
lembro e esqueço como foi o dia
Sempre em frente
Não temos tempo a perder
Nosso suor sagrado
é bem mais belo que esse sangue amargo
E tão sério
E selvagem, selvagem, selvageeemmm!”

Desgraça porque o amor, explodindo de paixão, pode queimar até ferir de forma irreversível.
A bateria então acelera a canção. A música vira o filme. O filme, a vida. A vida que é essa batalha de amor, do amor tentar suportar as dores que virão, que já estão vindo:
“Veja o sol dessa manhã tão cinza
a tempestade que chega
é da cor dos teus olhos... castanhos
Então me abraça forte
E me diz mais uma vez que já estamos
Distantes, de tudo
Temos nosso próprio tempo
Temos nosso próprio tempo”

Um dia descobrimos que não temos o nosso próprio tempo.
É o tempo que nos têm.
que nos consome.
que passa
e muita vez nós ficamos.
Parados num tempo perdido.
Cantamos então gritando forte, suplicando
“Não tenho medo
do escuro
Mas deixe as luzes, acesas,
Agora,
O que foi escondido é o que se escondeu
E o que foi prometido
Ninguém prometeu...”

A vida passa, alucinadamente rápida, atropela e derruba muitos.
Os que têm sorte ficam de pé, amparados nos braços que soube manter ao seu redor, no abraço-laço inquebrantável que sustentamos sem o erro das paixões cegas.
Outros tantos sonham. Lembram. Tentam desesperadamente voltar.

E a gente volta, embalados por Aline e Wagner nos cantando essa canção
Nos envolvendo em uma química total que explode a cada encontro
a cada reencontro.
A cada cena desse filme que faz a mais perfeita utilização de uma canção em toda a sua trama que o cinema brasileiro já viu. E olha que o resto da trilha sonora também é TNT pura, penetra nos poros em outras cenas-canções espetaculares como Creep, do Radiohead.

Por tudo isso, mesmo com tantas cagadas que fizemos em nossas vidas, O Homem do Futuro nos lembra que
“Nem foi tempo perdido”.

quinta-feira, setembro 01, 2011

A Artista e a História


Não existe prova mais técnica e requintada no atletismo. Nada requer mais habilidade. Poucas modalidades são tão arriscadas e requisitam tanta coragem nos anos de iniciação e aprendizagem. O salto com vara é a prova dos grandes artistas e atletas cerebrais do atletismo, rivalizando um pouco, talvez, só com o salto em altura. É preciso ter força e velocidade na corrida, uma visão de longo alcance para enquadrar a pista, vara e sarrafo, terra e céu. Não é prova para gente ansiosa e desequilibrada, pois é preciso saber a hora exata para lançar a vara e deixá-la em busca do sarrafo celeste. São anos e anos de ajustes finos nos treinos e muita coragem para desafiar alturas inimagináveis e os próprios limites nas competições.
Fabiana Murer superou todas essas etapas e ainda o violento baque de perder uma de suas varas na Olimpíada de Pequim (sumiram com ela, numa falha de organização absurda), perder a concentração e acabar fora do pódio no desafio máximo de seu esporte, o ouro olímpico. Como os pobres de espírito sempre surgem nas derrotas, Fabiana virou motivo de chacota para alguns pela vara desaparecida que arruinou seu sonho em 2008.
Guerreira, porém, ela seguiu lutando e dois anos depois conseguiu o ouro no Mundial Indoor. Uma competição com peso menor, mas valiosa. A consagração estava chegando, e veio esta semana em Daegu, no Mundial, ao ar livre. Igualou a maior marca de sua vida, 4m85, bateu suas maiores rivais, incluindo a lenda Isinbayeva, e colocou o Brasil pela primeira vez no lugar mais alto do pódio num Mundial em ar livre, que é a conquista máxima deste esporte, perdendo apenas para uma Olimpíada.
Além do talento e esforço pessoal - e de uma tranqüilidade sob pressão e concentração rara para uma atleta brasileira, sempre sujeita às emoções intensas que é nossa grande característica - a vitória de Fabiana passa também por alguns homens fundamentais. Seu treinador desde o começo, Élson Miranda, o homem que a formou no salto com vara e a fez evoluir. E também o super treinador desta modalidade, o russo Vitaly Petrov, simplesmente o cara que criou o mito Isinbayeva, e há algum tempo se dedica a ensinar à brasileira o que separa um grande atleta de um campeão mundial e olímpico. A dupla Élson/Petrov é uma ferramenta poderosa para Fabiana lutar pelo pódio olímpico em Londres, ano que vem.
Destaco também nesse histórico feito do salto com vara (e do atletismo brasileiro, pois é nosso primeiro ouro num Mundial), um homem que ajudou a sedimentar o salto com vara no Brasil. Falo do ex-campeão brasileiro e sul-americano várias vezes do salto com vara e um dos primeiros grandes atletas dessa modalidade no Brasil, o grande Renato Bortoloci, que depois se tornaria o inesquecível treinador Bortô. Quem teve a honra de ser seu atleta, como eu fui no E.C. Pinheiros no final dos anos 80, sabe que a paixão, dignidade, caráter e inspiração do Bortô tem um pouquinho de importância na medalha da Fabiana. Vi então nesse ouro um pouquinho do suor e alma do Bortô, que inclusive, se não me engano, foi quem iniciou o Elson Miranda, treinador da Fabiana, no salto com vara.
Campeões do esporte nesse Brasil que nunca fez nada pela massificação do esporte nas escolas e universidades costumam ser super talentos que brilham por conta própria, verdadeiros milagres. Fabiana, por mais genial que seja, não me parece ser esse caso. Parece mais o produto de um trabalho de amor e dedicação feito no salto com vara há algumas décadas. Campeões precisam de tempo e um longo trabalho em suas modalidades por trás, como é o caso do vôlei e judô brasileiro. O resto são promessas estapafúrdias do nosso Comitê Olímpico, que diz que criará um país olímpico sem investir na base do esporte. Que a história do salto com vara no Brasil e de Fabiana sirva de exemplo.

sexta-feira, agosto 19, 2011

O pior é que ele é a regra

Tudo pelo sucesso. Passar por cima dos outros. Fazer qualquer coisa para alcançar seus objetivos. E esse qualquer coisa envolve qualquer tipo de artimanhas e recursos (falta de?). Este é o José Mourinho do Real Madrid, e também, em menor escala, o da Inter de Milão.
Quando Mourinho percebeu que não ganharia do Barcelona de Messi, Xavi, Iniesta e Guardiola na bola, resgatou uma profissão que não existia no grande Real, um clube orgulhoso de esquadrões que encantaram o futebol jogando um futebol ultra ofensivo e belo. A profissão de capanga.
Uma das poucas vezes em que o bando de Madrid de Mou venceu este Barça maravilhoso ocorreu quando o capanga Pepe entrou em campo com uma única missão: não deixar Messi jogar. Sem eufemismos: enfiar a porrada no Melhor do Mundo sem dó.
O problema para Mou é que nas partidas seguintes, nem as pancadas assassinas de Pepe (não entendo como esse boçal ainda não quebrou a perna de Messi) adiantaram. Então ele reforçou o Bando de branco. Bastou perceber quais seus jogadores de caráter mais frágil e duvidoso. Pronto. O primeiro da lista é Michel Salgado, que começou a distribuir pontapés sem dó.
Não bastou. Então Mourinho percebeu um capanga dos sonhos: jovem, veloz, forte. O brasileiro Marcelo. Resultado? O colocou em campo com uma única missão: arrebentar Fábregas. Quase conseguiu, mas por um dos mistérios do Barça, não quebrou o filho pródigo barcelonista que acabava de voltar pra casa.
Batendo e batendo (e, na sua única estratégia vinculada ao futebol, pressionando o Barça em seu campo), Mou quase conseguiu sustentar um empate com a orquestra de Xavi, Iniesta e Guardiola. Até que Messi, pra variar, colocou um enorme ponto final na violência sem fim do Bando do português.
O mais incrível da história é o talvez maior clube de todos os tempos, o Real, aceitar vender sua alma para vencer o Barça depositando confiança e poder total a um general sem nenhum escrúpulo como Mourinho. E Mou, com seus seguidos ataques de histeria e imbecilidade fora de campo (a última foi sua agressão covarde no assistente de Guardiola, pelo que tomou um revide mais forte que sua agressão, toma!), contagia cada vez mais seus jogadores e não me surpreenderia se até o santo Kaká começasse a dar bordoadas quando entrar em campo.
Até o grande goleiro Casillas entrou no estúpido clima de guerra e deu uma entrevista vergonhosa ao final do último jogo, dizendo que Fábregas, ao ser agredido por Marcelo, "fez cena, como sempre". Por isso foi repreendido por um antigo ídolo do Real, o artilheiro Fernando Morientes. Este condenou não só a falta de sinceridade de Casillas como a postura bélica do Real.
Como bem disse hoje no Jornal da Tarde um de seus colunistas, essa apelação de Mourinho nunca caberia num time de Telê Santana. O jornalista lembra de uma declaração de Junior Baiano, que revelou não ter dado pontapés num jogador do Velez (o baixinho infernal Turco Asssad) que acabou com o São Paulo na final da Libertadores de 1994, porque o técnico era Telê.
O jornalista ainda diz que Mourinho tem muitos títulos no currículo, mas nenhum deles com o brilhantismo, beleza e jogo limpo de um Mestre do futebol como Telê.
O problema é que hoje, os Mourinhos aumentam cada vez mais, no futebol e na vida.
Fala-se muito no Mou “grande estrategista” que superou o Barcelona na Champions League em que venceu com a Inter de Milão. Daquela eliminação, com a Inter se defendendo o jogo todo, e baseando-se apenas nos contra-ataques e pauladas, lembro do comentário do grande Falcão, que era o grande líder do Brasil que encantou o Mundo em 1982, com Telê na direção. “Nunca vi uma retranca tão covarde em toda a minha vida como a da Inter contra o Barcelona”.
Triste é perceber que os covardes, violentos e arrogantes são reverenciados por muitos jornalistas e profissionais de outras áreas como homens de visão e mestres da estratégia.
Mas graças que existem ainda Homens e Artistas como o Barcelona, seu treinador e sua filosofia para mostrar como se pode ganhar com beleza e de forma limpa.
Cada jogada magistral de Xavi, Iniesta, Piqué e cia; e cada golaço de Messi não são apenas uma vitória do futebol arte.
São um foco de resistência dos homens decentes, nobres e corajosos contra a selvageria dos Bandos de Mourinhos e seus genéricos que infestam e dominam outras carreiras e empresas.

segunda-feira, agosto 15, 2011

Ajoelhem-se!

Foi simbólico. De joelho ele marcou nosso gol de empate. De joelhos, comemorou. Mas Rivaldo é tão grande que ele subverteu o sentido de estar de joelhos. Em vez de subjugado e dominado, como estavam todos os seus companheiros em mais uma medíocre atuação do São Paulo este ano (só mesmo o equilíbrio por baixo desse Brasileiro explica estarmos a 2 pontos dos líderes), ele mostrava que estava por cima, soberano.
Ainda tento entender sua comemoração e não me contento com a física, de que ele saiu ajoelhado do lance porque assim marcou o gol e não teve forças para se levantar. Creio mais na mágica do futebol, naquele inexplicável meio místico que ronda e protege os raros deuses do futebol brasileiro de hoje. Sim, deus, porque quem já foi o melhor do mundo e o maior jogador da conquista do Penta (sim, mais que Ronaldo) será sempre do Olimpo. Será sempre o único Rivaldo.
Colocado no banco por Adílson (acredito que queria poupá-lo mesmo, mas pecou nesta escolha porque sem ele o São Paulo vira um time comum), Rivaldo entrou e decidiu. Sim, tomamos o segundo gol com ele em campo, mas logo seus toques inteligentes e precisos começaram a machucar a até então tranquila defesa paranaense. E no finalzinho, sua colocação impecável de sempre, o fez estar onde os atacantes tricolores não tinham a inteligência para estar: pronto para marcar.
E lá foi então o velho Riva salvar o São Paulo.
E de joelhos ele comemorou. Talvez querendo mostrar que quem deve ajoelhar-se na verdade é o seu treinador e todo o elenco tricolor, com exceção de outro deus, Rogério. Sim, elenco do São Paulo, ajoelhem-se e agradeçam por terem o privilégio de ter um dos maiores jogadores da história do futebol ao seu lado.
Escutem o grande lance do Riva na narração da rádio Jovem Pan aqui
PS – Começo a desconfiar que Lucas não consegue aproveitar as lições práticas (toque rápido, passes certos, colocação, calma para decidir a melhor jogada etc) e os conselhos do gênio. Não dá pra admitir a afobação daquela isolada que nosso menino aprendiz deu na última chance do jogo. Toca a bola, garoto! Pensa mais, aprende com o Riva.

segunda-feira, agosto 08, 2011

Colômbia (1) – O povo é a viagem

   A Colômbia é um grande jardim. Não só das pequenas praças, jardins e parques em todo canto, mas de pessoas. Raros lugares e países possuem sintonia tão grande entre lugar e pessoas. Entre um povo e a natureza da qual cuidam com um capricho que é amor.
Um capricho quase inacreditável, porque muitos dos jardins são pequenos canteiros de grama verdinha aparada e flores na rua, ao lado das casas ou pequenos predinhos. Tradução? Os jardins não são escondidos dentro das residências mas sim oferecidos a todos.
Enquanto tantos, nesse mundo egoísta e individualista, guardam a beleza para si, os colombianos semeiam-na, compartilham. Porque assim é o coração desse povo: com fragrâncias variadas, múltiplas, colorido como sua bandeira.
Uma bandeira que ficaria mais exata se mostrasse nela o sorriso, indescritível (é preciso ir lá e perceber a dimensão dele) desse povo que acolhe com a alegria sincera de uma criança que deseja mostrar ou oferecer seu desenho para o pai ou mãe.
Oferecer, este um dos verbos que mais traduz a alma do colombiano, pois eles sempre estão nos oferecendo um sorriso e algumas palavras com uma simpatia genuína. Um simpatia que traduz a alma de um dos povos mais educados que conheci na vida. Ou não é educado um povo em que até os policiais e soldados, quando pedimos uma informação, nos atendem com um “a su merced, caballero” (a sua mercê, cavalheiro). Igualzinho aos oficiais brasileiros... 
Ou não é educado um povo que, em qualquer comércio, é amabilidade pura, com raras exceções como uma das únicas vendedoras secas que encontrei, no único dia em que fui a um shopping... Talvez porque shoppings se assemelham em qualquer lugar do mundo ao esconder e matar  a essência de um lugar, povo e país. Se bem que o shopping que visitei em Medellín tem até um belíssimo jardim e atividades culturais...
Mas volto às flores, onipresentes no bairro onde fiquei, em Bogotá. Quando o verde e os jardins acabavam, encontrava uma área esportiva, com quadras e barras para exercícios. Então as flores viravam pistas de patinação e quadras poliesportivas. E as cores e verde vinham é das crianças e jovens que praticavam esportes orientadas por treinadores. Treinadores na maioria voluntários. Esporte e cidadania, ao lado da rua.
Ou cultura e cidadania, como no incrível evento educacional que presenciei (graças à dica da mocinha da recepção de meu hotelzinho, em Medellín) no Jardim Botânico. Eram dezenas de oficinas de texto, argila, desenho, música, circo etc etc lotadas de crianças aprendendo brincando. 
   Jardim Botânico, Medellín
   Aí lembro do belíssimo Jardim Botânico, do Rio de Janeiro, por exemplo, e nunca soube de um evento para crianças lá. Incrível como os parques brasileiros são subutilizados. O nosso Ibirapuera, aqui em São Paulo, por exemplo, tem eventos incríveis, mas em geral dentro do Pavilhão da Bienal ou da Oca, quase sempre em eventos pagos. Só os shows de música são grátis ou uma ou outra atividade esporádica.
Ainda na cultura, a Colômbia é tão inovadora e bela que construiu bibliotecas enormes dentro das favelas e parques, e podemos ler enquanto olhamos a paisagem, pois não são bibliotecas como as nossas, verdadeiros sarcófagos, mas isso é assunto para outro post.
    Biblioteca Pública ao lado da favela, no morro, em Medellín
   Volto aos sorrisos, e lembro com saudade da incrível hospitalidade do pessoal do pequeno hotel com jeito de casa de família onde fiquei em Bogotá. Toda hora em que saía do quarto recebia sorrisos e palavras calorosas. Bem diferente da simpatia falsa, por obrigação, de muitos hotéis, ali o Juan, o Diego e a inacreditavelmente atenciosa Paulina fazem cada hóspede sentir-se mesmo em casa.
Uma grande casa e lar chamada Colômbia.
Não preciso de paisagens de cartão postal, ou imagens de National Geographic, de tirar o fôlego, para ganhar a beleza, com que sonha qualquer viajante.
Preciso apenas de belezas simples de lugares bem cuidados e de um povo incomparável.
Preciso apenas conhecer um lugar em que o destaque é o calor humano, e não monumentos ou dádivas monumentais da natureza.
Os maiores tesouros deste planeta, para mim, não são lugares. São pessoas. E o que as pessoas fazem desses lugares.
* Dedico esse texto a uma querida aluna que anda meio distante, mas que um dia escreveu um maravilhoso texto revelando o tipo de viagem com que ela sonha: a viagem para lugares e países não tão badalados, porque ela sabe que nesses lugares e povos ela encontrará sentimentos e belezas mais genuínas e secretas. Vá um dia pra Colômbia, Victória, um lugar igualzinho aos seus sonhos.
    Parque Simón Bolívar, Bogotá

quinta-feira, agosto 04, 2011

Pasión por el fútbol

 Para los amantes del fúbol y de las histórias, he creado un nuevo blog, de histórias sobre el fútbol que es pasión. Basta hacer el click en Recuerdos del Balón

segunda-feira, julho 25, 2011

El arte de ser Celeste

No dejen decirles que ustedes son solamente garra. No dejen decirles que ustedes no tienen grandes artistas, del tamaño de otros grandes campeones.
No dejen decirles que esa selección es solamente un equipo bien organizado, donde juegan hombres que están juntos hace mucho tiempo.
No dejen los derrotados y algunos periodistas extrangeros- que no saben ver más allá y más para dentro - intenten disminuir el valor de esa Celeste.

No dejen, porque no es verdad.
La verdad es que no hay hoy, en el Mundo, un delantero tan completo como Luisito Suárez, una tormenta para cualquier defensa adversária, un ilusionista, un inventor de espacios donde no hay, un mágico, un matador implacable frente a frente con los arqueros. En ese grande western que son los partidos de decisión, Suarez es el Clint Eastwood del gol. No duda nunca. Marca. Y, pistolero romántico (¿existe eso en las películas?), tiene el placer de dejar algunos disparos fatales para sus compañeros, como hizo en el último gol. El gol que consagró su amigo y también matador, Diego Forlán.
¿Acuerdante del arte, que empezó ese texto? Forlán es arte puro cada vez que sus piés tocan la pelota. Mirarlo es como volver en el tiempo y revivir aquellos maestros del snooker, que daban sus tacadas con una clase, estilo y fuerza mágicas. Es Forlan también un esgrimista del fútbol, haciendo siempre un gesto casi perfecto de patear la pelota. Como sí fuese un D´Artagnan del balón, no solamente pateas, mata, hace siempre un gran touché!
El destino y la poesía épica que escriben los grandes campeones no podia dejar el mosquetero sin besar las redes en esa Copa América ya mítica. Hicelo dos vezes, porque es um hombre de leyenda, y la leyenda del mayor goleador de la história de La Celeste necesitaba el número 2.
El mismo número, pero en las espaldas, lleva o Gran Capitáin, el General, Ese verdadero Rey Viking. Diego Lugano, El Thor charrúa, un monstruo, el hombre que mira altivo los exércitos enemigos y gritales con todas sus venas: NO PASARÁN! Y, caso lo casi imposible suceda, que Lugano sea derrumbado, los adversários veen El Sucesor del Furioso, veen al también hercúleo, enorme, Sebastián Coates. Solamente pueden desistir y bater en retirada. Pues los defensores uruguayos son como el Obélix de la historieta belga, conocen todo de la arte de resistir. Y tratan a todos como romanos...  (¿Suarez y sus compañeros serian un exército de Asterix???)
Ante un invasor, La Celeste tiene el espírito, el coraje y el arte de las palavras del espartano Leónidas cuando el emissario del rey Dario mandó decirle para bajar las armas, porque Persia tenia tantas flechas que cubriria el Sol. Leónidas, ese grego de alma charrúa, contestó: "Mejor, combatiremos en las sombras".
La resistencia, sin embargo, no es únicamente el arte de Lugano y Coates. Es también el poder de quitar la pelota, es el poder de anticiparse. ¿Quién es mayor, hoy, que Arévolo Ríos, en esa tarea de bravos? ¿No es arte lo que hice en el segundo gol de Uruguay, robando y después regalando su amigo Forlán???
¿No es arte la capacidad de los Pereiras de crear ataques peligrosos en las esquinas del campo?
¿No es arte esa gana de dar el sangre por una simple recuperación de la pelota, como aquella increíble carrera de Ruso para no dejar la pelota salir?
¿No es arte, enseñanza de la vida para el fútbol y para todos, el hecho de que eses jugadores celestes son también amigos, más que eso, compañeros?
¿No son arte las sonrisas del fondo del alma y los abrazos de hermanos que eses jugadores ofrecen para cada uno que viste ese manto celeste?
¿No es arte la emoción de niños que eses hombres demostran en cada partido, en cada gol?
¿No es arte, una verdadera pedagogia del fútbol más humano y bello, lo que enseña el padre de todo eso, el Maestro Óscar Tabarez?
¿No es arte todo ese proyecto que Tábarez empezó seis años atrás?
A los pobres de espírito que no veen más que la eterna vieja charrúa (si, colosal!) en ese Uruguay, no comprenderan nada. Tal vez porque, como enseñó el viejo maestro (Jackie Chan) de la película Karate Kid al hijo de Will Smith, no saben que “no basta ver, hay que sentir”.

Hay que sentir el fútbol - en la piel, en el corazón y en el alma – para aprender todas las lecciones grandiosas de los hombres de Tabárez.
Hay que amar, el fútbol y la vida, para aprovechar las maravillhosas jornadas de esa Celeste, tal vez la más bella campeona de la história de la Copa América.
La más bella porque la más humana.
Porque hecha de jugadores que son hombres nobles y apasionados.
Hombres solidários, que juegan por todo un país.
Gracias por todo eso! (y perdonánme por ese castellano lleno de errores de un brasileño).

"Aunque no sea Uruguay
Me emociona ese país de corazón 
Amo el fútbol de los charrúas
Su Equipo que me deja feliz 
Porque pelea con el alma 
Pelea sin temor 
Porque pelea por el País 
y lo hace con amor"  
(Versos de José Eduardo de Oliveira Costa, 76 años, mi papá)

PS - ?No es arte el gol más bonito de toda esa Copa América, el último gol de Uuguay???

quinta-feira, julho 21, 2011

Um surfista de coração

Num meio tão individualista como o surf e, sim, tão alienado (surfar é tão viciante que a maioria dos surfistas não aproveita para conhecer os lugares e povos que visitam), é bacana perceber que existem alguns caras diferentes como o australiano Joel Parkinson. Há anos ele ajuda financeiramente uma senhora sul-africana que conheceu quando ela cuidava da casa onde ele se hospedava em Jeffreys Bay, África do Sul. A senhora limpava a casa, fazia as refeições e, muito mais que isso, oferecia um carinho e uma alegria gratuita com que os australianos que lá se hospedavam não estavam acostumados.
Um dia Thelma, nome da senhora, foi violentamente ferida em um assalto, e ficou impossibilitada de trabalhar. O que fez Joel, lá em 2003? Começou a depositar dinheiro na conta dela para que mantivesse uma vida digna para sua família na favela em que vive a 10 km das ondas perfeitas de Jeffreys Bay. Um lugar chamado Oceanview, mas que não tem vista para o mar.
Além da nobreza do gesto e atitude, as palavras de Joel, explicando a razão de ajudar essa senhora há tantos anos, merecem uma reflexão de todos nós:
"Eu tenho muitos amigos que ajudo mas você não recebe um obrigado, um sorriso enorme, um abraço ou um beijo deles (as). Com ela, você sente como se desse um pouquinho e ela sente como se recebesse o mundo. O rosto dela ilumina mais que qualquer coisa que você possa imaginar e faz tudo valer a pena”, revelou Joel na reportagem do site surfline.com.
Num mundo em que poucos agradecem a ajuda, força ou conselho que recebem em algum momento importante de suas vidas, Joel e Thelma são exemplos raros.
Joel já era um dos surfistas que eu mais admirava fora d´água pela temporada em que deixou de competir em 2 eventos importantes porque sua esposa estava perto de dar à luz. E isso ele fez numa temporada em que era o líder do ranking. Abdicou da chance de vencer o mundial porque queria apoiar a esposa, o amor de sua vida.
Amor parece ser algo mesmo grande demais no peito de Joel Parkinson, um surfista e homem fora de série.
* Mais detalhes desta história no link da Surfline

quarta-feira, julho 20, 2011

A crise moral do esporte brasileiro

A vergonhosa participação da seleção brasileira na Copa América passa, muito, pela crise moral que o futebol e várias modalidades atravessam no Brasil. A crise começa no visual, com muito jogador se preocupando demais com o corte novo no cabelinho, a roupinha descolada e até o headphone mais vistoso e potente. Há também muita brincadeirinha, tiração de sarro e trotes bobos na seleção. Coisa normal, da “alegria” do jogador brasileiro? Ontem o goleiro Julio César revelou que temia pelo desempenho brasileiro nos pênaltis porque ele sabia do fraco aproveitamento nas cobranças dos seus companheiros nos treinos. Treinos de pênaltis que eram mais brincadeiras do que ensaios sérios. Treinos que Mano Menezes nem acompanhava.
O visual é um elemento banal, menor, mas já demonstra uma excessiva vaidade individual. Que Neymar use aquele moicano ridículo, vá lá porque ele se garantiu no Santos ganhando tudo assim (não na seleção...). Quando Daniel Alves imitou o penteado, deu no que deu...
Pior é a falta de uma equipe e espírito de grupo, claríssima na seleção do grupo dos veteranos liderados por Lúcio e no dos moleques, liderados por Neymar e apadrinhados pelo veterano que nunca amadureceu, Robinho. Mas não me venham falar no grupo unido do Dunga, porque grupo unido em torno de uma ideia e estilo imbecil (o tal futebol guerreiro que resultou em aberrações como Felipe Mello), não vale.
Cada vez mais nítida também a postura blasé, fria, com que os jogadores vestem a camisa da seleção. Em campo, a postura blasé vira aliada do individualismo de quererem decidir os jogos sozinhos. E voltando a respeito, eles só demonstram isso por quem lhes pagam fortunas, os seus clubes. Uhn, respeito em termos, porque é um tal de jogador quebrar contrato e fazer chantagem pra ser liberado para outros clubes... Grande parte dos jogadores de ponta brasileiros só pensam em grana, em salários maiores. Mesmo um ídolo amado de uma torcida, Kléber, anda fazendo de tudo para ir para o Flamengo. Amor da torcida? Ele não tá nem aí pra vocês, palmeirenses.
Claro que a culpa não é só dos jogadores. Há também os empresários inescrupulosos que assediam e compram os direitos dos atletas desde que são garotos. Há os dirigentes dos clubes, que não estão nem aí em acompanhar os estudos dos meninos das categorias de base. Todos só querem faturar em cima dos garotos. E não estão nem aí quando 99% deles não dão certo na bola e, como não estudaram, vão se ferrar na vida.
Há também a culpa da mídia, que exalta qualquer um com um pouquinho mais de talento, massageando o ego vazio de nossos jogadores sem a mínima formação educacional e moral.
O mais triste é que o problema não fica só no futebol. O descaso com a formação dos atletas como homens existe até no “tão organizado” vôlei, em que os melhores do país passam longas temporadas concentrados no CT de Saquarema, e a escola que se dane.
E esse desrespeito acontece em várias modalidades. Tenho um grande aluno, cabeça boa, sério, dedicado, grande coração, que simplesmente quase não esteve em sala de aula no primeiro semestre inteiro. Ou estava concentrado com a seleção, em outra cidade, ou estava disputando competições no exterior. Óbvio que os dirigentes do seu esporte não está nem aí para a formação dele num ano-chave, o último do colegial, às portas do vestibular e da escolha de uma carreira. Só querem saber das conquistas do garoto, que vem trazendo grandes resultados ao país. Planejamento da Confederação e organização para respeitar o período letivo do garoto? Zero. Qual o preço que o menino pagará, no futuro, por seu empenho no esporte?
Basquete? Talvez o caso mais claro de falta de respeito com seu país. Os mais badalados atletas brasileiros simplesmente se recusam, seguidamente, a vestirem a camisa da seleção, como fazem Leandrinho e Nenê. E ainda dão desculpas esfarrapadas para não defenderem o Brasil. Gozado que o MVP das finais da NBA, onde os brasileiros jogam (pouco, são reservas de luxo...), o alemão Dirk Nowitiki, nunca deixou de atender a uma convocação da seleção alemã. E disse uma vez que, se for preciso, ele mesmo pagaria o seguro exigido por seu clube na NBA.
Mais da crise moral? Mesmo os diferenciados jogadores de vôlei da seleção, dos quais realmente podemos sentir a paixão e orgulho com que defendem a amarelinha, mancharam suas carreiras belíssimas com aquela vergonhosa partida entregada ordenada por Bernardinho no Mundial do ano passado.
Natação? Sim, Cielo está ainda se defendendo da acusação de doping na China, mas o fato é que, neste século, adivinhem qual o país que teve mais atletas flagrados no exame anti-doping de natação em todo o mundo? Sim, Brasil.
O mesmo doping que fez um verdadeiro arrastão em muitos grandes nomes do atletismo brasileiro no ano passado, incluindo um dos mais renomados treinadores de nossa história.
Até no vôlei de praia somos pêgos agora, como ocorreu com Pedro Sohlberg, flagrado por tomar esteróides. Imagino o desgosto de sua mãe, a grande Isabel, uma das mais valentes e íntegras atletas de nossa história, uma das responsáveis por o Brasil ser hoje uma potência no vôlei feminino.
Tudo isso para dizer que há um descaso muito grande na formação dos atletas brasileiros hoje que resulta em cabeças vazias e individualistas e um vale tudo por resultados (doping, entregadas etc).
Como resolver isso? O pequeno e vizinho Uruguai dá a receita, com seu belíssimo projeto implantado por Oscar Tabarez no futebol, em que os jogadores das seleções de base estudam e são acompanhados por profissionais de várias áreas. Os frutos estão aí, com a Celeste brilhando na equipe adulta e no sub-17 (vice-mundial) e sub-20.
O problema é que basta olhar para o presidente do órgão esportivo mais poderoso do país, Ricardo Teixeira e sua CBF (sua porque ele faz dela o que bem entende) para imaginar ele refletindo sobre a formação do jogador brasileiro. Com sua linguagem chula típica (leiam a chocante, debochada e nojenta entrevista dele na revista Piauí deste mês) ele deve pensar, “que se f...”.
Pensando nas outras modalidades, o poderoso Nuzman e seu milionário Comitê Olímpico Brasileiro (sim, seu...) só trabalha pelo esporte de alto rendimento. Joga a responsabilidade do trabalho de base para o governo e para os clubes (como, se estes, com raras exceções como um Pinheiros, um Minas Tênis, só pensam no futebol?).
O futuro é negro.
PS – A razão das fotos que ilustram esse post? Reparem no uniforme sóbrio, respeitoso e padrão dos uruguaios e pensem na seleção brasileira... Ah, e eles preferem a companhia de um mate (que compartilham) que de aparelhinhos, celulares etc. A outra foto é do jovem Denílson, que volta ao São Paulo depois de anos na Europa e não se dá o trabalho de tirar o bonezinho e o óculos-escuro para posar com a bandeira do clube.
Nunca vi Raí, maior jogador da história do São Paulo, de boné ou óculos-escuro.